
Mesmo com crescimento econômico e programas sociais, milhões ainda vivem à margem nas cidades e no campo do Nordeste.
Por Alenilton Malta
A desigualdade social ainda é uma ferida aberta no Nordeste do Brasil. Apesar dos avanços em infraestrutura, educação e inclusão nos últimos anos, a região continua entre as mais afetadas pela pobreza, pelo desemprego e pela exclusão social. Em pleno século XXI, a luta por dignidade e oportunidades ainda é uma realidade cotidiana para milhões de nordestinos.
Segundo dados do IBGE, cerca de 45% da população nordestina vive com menos de meio salário mínimo por mês. Em estados como Maranhão, Piauí e Alagoas, os índices de pobreza ultrapassam a média nacional. A seca prolongada em algumas áreas, a concentração de renda e a falta de investimentos estruturais agravam o cenário, especialmente nas zonas rurais e nas periferias urbanas.
Heranças Históricas e Desafios Atuais
A desigualdade no Nordeste tem raízes profundas. Desde o período colonial, a região sofreu com a concentração de terras e a exploração econômica voltada para poucos. Mesmo com a modernização e o crescimento de polos urbanos como Salvador, Fortaleza e Recife, as disparidades entre centro e periferia, entre capital e interior, permanecem marcantes.
A pandemia de COVID-19 trouxe um impacto devastador, principalmente entre os trabalhadores informais — que são maioria em muitas cidades nordestinas. Sem segurança de emprego, muitos ficaram sem renda e enfrentaram dificuldades para acessar os auxílios emergenciais, por falta de informação ou de conectividade digital.
Educação e Saúde: Avanços e Lacunas
Nos últimos anos, programas como o Bolsa Família (agora incluído no Auxílio Brasil), o Mais Médicos e investimentos em universidades federais ajudaram a ampliar o acesso a serviços básicos. O número de jovens nordestinos nas universidades cresceu significativamente.
Contudo, ainda existem grandes desigualdades. Em muitos municípios do sertão, o acesso à saúde de qualidade é precário, e escolas públicas enfrentam carência de estrutura, materiais e profissionais qualificados.
Fome e Insegurança Alimentar: Um Drama Silencioso
A fome voltou a fazer parte do cotidiano de muitas famílias nordestinas. Dados da Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional) apontam que, em 2023, mais de 30% dos lares do Nordeste enfrentavam algum nível de insegurança alimentar — sendo que em 14% deles havia privação severa de alimentos.
No semiárido, onde a agricultura de subsistência é o sustento de milhares de famílias, a irregularidade das chuvas, a falta de acesso a crédito e a ausência de assistência técnica dificultam a produção. Muitos pequenos agricultores sobrevivem com o mínimo, sem apoio suficiente do Estado.
“Com a estiagem, perdemos a lavoura. A gente só come o que ganha na feira ou com ajuda dos vizinhos. Já passamos dias comendo só cuscuz e sal”, conta Maria das Graças, agricultora de 57 anos no sertão da Paraíba.
O Nordeste Urbano: Favelas e Exclusão nas Capitais
Nas capitais nordestinas, como Salvador, Recife e Fortaleza, o crescimento urbano desordenado gerou grandes bolsões de pobreza. Bairros inteiros convivem com falta de saneamento básico, transporte precário, violência policial e ausência de políticas públicas efetivas.
Na periferia de Maceió, por exemplo, jovens enfrentam o abandono escolar e a falta de oportunidades. Muitos são aliciados por facções criminosas que exploram a vulnerabilidade social. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o Nordeste concentra as maiores taxas de homicídios do país, afetando principalmente a juventude negra e pobre.
A educadora social Viviane Souza, de Salvador, ressalta: “Falta presença do Estado onde o crime chega primeiro. Precisamos de escolas, cultura, esporte e esperança. Os jovens têm talento, mas precisam de oportunidades reais.”
Iniciativas que Transformam
Mesmo diante das dificuldades, o Nordeste pulsa com criatividade, organização popular e solidariedade. Exemplos disso são os coletivos culturais nas periferias urbanas, os projetos de agroecologia no campo e as redes de economia solidária.
Na cidade de Aracaju, o projeto “Meninas Empreendedoras” capacita jovens mulheres em tecnologia e gestão de negócios. Em Petrolina, cooperativas de mulheres produzem alimentos orgânicos e geram renda local. Já em Fortaleza, o grupo “Favela Orgânica” ensina técnicas de compostagem e aproveitamento integral de alimentos.