O secretário de Cultura e Turismo de Salvador, Pedro Tourinho, usou as redes sociais, nesta terça-feira (17), para fazer críticas após Claudia Leitte substituir mais uma vez o nome de Iemanjá, a orixá das águas, na letra da música “Caranguejo”
A situação em questão aconteceu no sábado (14), durante a o primeiro show de ensaio de verão da artista no Candyall Guetho Square, em Salvador, onde fica a sede da Timbalada – banda criada por Carlinhos Brown.
Em vídeos que viralizaram na web, a cantora aparece cantando “Eu canto meu Rei Yeshua” (Jesus em hebraico) ao invés de “Saudando a rainha Iemanjá”, como já fez em outros shows pelo Brasil desde 2014, mesmo período em que se converteu evangélica.
Sem citar o nome da artista e sem trazer o trecho, Tourinho compartilhou cards com um longo texto exaltando a importância do Axé e chamando atenção para a origem do ritmo nas religiões de matriz africana.
“Axé é uma palavra de origem yorubá, que tem um significado e um valor insubstituível na cultura e nos cultos de matriz africana. Deste mesmo lugar, e com essa mesma importância, vêm também os toques de percussão que sustentam, dão identidade e ritmo à chamada Axé Music”, escreveu.
Em seguida, o secretário chamou atenção para como artistas brancos acabam se sobressaindo em relação a outros, que são negros, quando se fala em destaque na música.
“Sempre há tempo para refletir, entender, mudar e reparar, mesmo após os 40 anos. O papel da cultura negra no axé music, o protagonismo dos cantores brancos, com os negros na composição e na ‘cozinha’, são fatos que não podem ser contornados. Não é para se fazer caça às bruxas, mas sim fazer justiça e colocar tudo no seu devido lugar”.
Por fim, Pedro Tourinho se colocou contra a retirada dos nomes de orixás das músicas originalmente escritas com as menções, e ainda apontou racismo na atitude.
“Quando um artista se diz parte desse movimento, saúda o povo negro e sua cultura, reverencia sua repercussão e musicalidade, faz sucesso e ganha muito dinheiro com isso, mas, de repente, escolhe reescrever a história e retirar o nome de Orixás das músicas, não se engane: o nome disso é racismo”, escreveu.
Pouco depois, Ivete Sangalo surgiu nos comentários da publicação, defendendo o pensamento, com direito a palmas.
“Sim! 👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻”, comentou a cantora.
Publicação viralizou
A postagem viralizou em seguida, levando ao secretário de Cultura de Salvador a fechar os comentários. Autor de um livro intitulado “Ensaio Sobre o Cancelamento”, Pedro Tourinho fez uma edição na legenda explicando a decisão.
“Essa questão que levantei é muito mais sobre o todo do que sobre a parte, e maior e mais endêmica do que qualquer caso isolado. Sei que perde-se controle, mas a intenção não é alimentar hate contra ninguém, e sim puxar a discussão como um todo sobre a necessidade de saber o que é axé e reconhecer toda a história. Fechei comentários porque a discussão estava indo na direção errada”, escreveu.
Crítica recorrente
Em fevereiro deste ano, o assunto já tinha sido abordado pela cantora, atriz e apresentadora Larissa Luz, depois que um trecho da mesma música viralizou. Só que, na ocasião, a imagem era de um DVD de Claudia Leitte gravado no mesmo ano em que a artista passou a fazer a substituição.
Em resposta, Larissa Luz fez uma gravação em que ela também troca versos de canções católicas do cantor Roberto Calos por nomes de orixás.
“Oi, gente, hoje vim cantar para vocês um trecho de uma música que gosto muito, mas fiz uma ‘adaptaçãozinha’ para colocar no meu repertório. Para ficar mais a ver comigo, com minha crença, com minha realidade e ficou mais ou menos assim”, disse a cantora baiana nas redes sociais.
Em seguida, Larissa cantou os refrões das músicas: “Oxalá, oxalá, oxalá, eu estou aqui” e “Essa luz é claro que é Exu”. Para finalizar, a artista deixa um recado: “Tu para, mulher”.
Na legenda da publicação, Larissa Luz ressaltou que o vídeo continha sátira e humor.
“Favor se esforçar para entendimento caso não haja‼️ Bora tá refletindo!!? Lembrando que nesta casa adoramos o respeito! Eu ouvi amém?! Axé”.
Leia a crítica de Pedro Tourinho na íntegra abaixo 👇
“Axé é uma palavra de origem yorubá, que tem um significado e um valor insubstituível na cultura e nos cultos de matriz africana. Deste mesmo lugar, e com essa mesma importância, vêm também os toques de percussão que sustentam, dão identidade e ritmo à chamada Axé Music.
Sempre há tempo para refletir, entender, mudar e reparar, mesmo após os 40 anos. O papel da cultura negra no axé music, o protagonismo dos cantores brancos, com os negros na composição e na ‘cozinha’, são fatos que não podem ser contornados. Não é para se fazer caça às bruxas, mas sim fazer justiça e colocar tudo no seu devido lugar.
Homenagens ao Axé Music em 2025 têm de ser também afirmativas, trazendo os tambores para frente, os compositores para o alto. Têm de remunerar também de forma equivalente todas as cores. Têm de trazer a informação da origem daquela batida, falar de Dodô tanto quanto de Osmar. Celebrar aquele momento, trazendo luz a tudo e todos.
Quando um artista se diz parte desse movimento, saúda o povo negro e sua cultura, reverencia sua repercussão e musicalidade, faz sucesso e ganha muito dinheiro com isso, mas, de repente, escolhe reescrever a história e retirar o nome de Orixás das músicas, não se engane: o nome disso é racismo, e é surreal e explícito reforço do que houve de errado naquele tempo”.