Mulher parda perde vaga em concurso público federal após ter cota racial negada por ‘ser branca’

Uma mulher parda foi eliminada de um concurso público federal da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) após ter acesso a cota racial negado, mesmo sendo uma mulher parda. Luana Dandara Barreto Torres, de 32 anos, teve sua cor de pele considerada “inexpressiva” e “inexistente” por uma banca de heteroidentificação do Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (Cebraspe), responsável pelo processo.

Residente em Belo Horizonte, Minas Gerais, Luana teve suas características fenotípicas avaliadas em 16 de junho para concorrer dentro da política de cota racial ao cargo de Especialista em Recursos Hídricos e de Saneamento Básico, que ocuparia em Brasília. O resultado foi emitido depois de dez dias e a classifica como uma mulher branca, definindo-a como não cotista.

Segundo a análise da comissão, Luana “não possui caracteres que a credenciam a concorrer às vagas reservadas às pessoas negras” e, portanto, há “incompatibilidade entre o fenótipo do candidato e o que se observa em pessoas negras”. A banca definiu as características fenotípicas como branca, de cabelo ondulado e de textura inexistente, lábios finos e nariz médio.

“Fiquei muito surpresa porque isso nunca me aconteceu. Nunca na minha vida eu imaginei que fosse ser considerada branca por uma banca de heteroidentificação”, afirma Luana para Marie Claire. Desde então, a professora afirma que tem tido dificuldade para dormir e se sente constantemente ansiosa. “A gente começa a questionar nossa identidade. É impossível que as pessoas olhem para mim e vejam que sou branca. Isso nega toda minha experiência com o racismo ao longo da vida”, diz.

No dia 27 de junho, Luana entrou com um recurso administrativo em que refuta a banca e sugere que os membros revisitem “com maior atenção o vídeo gravado no momento da avaliação, para que se corrija o parecer”. Se for indeferido, pretende entrar com uma ação judicial.

“É complicado gastar dinheiro por uma coisa que é direito seu. Geralmente, não tem ressarcimento desses custos e há um desgaste emocional atrelado a isso, além da insegurança de saber se vou poder ou não continuar no concurso. Teria de me mudar para Brasília e preciso me remodelar, meu contrato de aluguel vai vencer em seis meses e não sei se vou me mudar”, afirma Luana.

Luana também acusa a mesma banca de adotar critérios distintos em estados brasileiros diferentes, o que teria feito com que pessoas com traços menos expressivos que o dela fossem admitidas como pardas. “Era para esse sistema nos proteger e barrar os brancos, mas acaba punindo pessoas miscigenadas. Esses critérios precisam ser revistos”, acrescenta.

Procurada pela reportagem, a ANA diz que o Cebraspe “possui larga experiência e competência técnica em concursos públicos” e que o resultado emitido no dia 26 de junho é provisório. O resultado da análise dos recursos dessa etapa estão previstos para divulgação em 10 de julho.

Em nota, a Cebraspe afirma que a denúncia “não procede” e que critérios de avaliação fenotípica seguem instruções firmadas pela Instrução Normativa 23/2023 do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI)

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