
A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) decidiu rejeitar a inclusão de dois medicamentos usados no tratamento de diabetes tipo 2 e obesidade: liraglutida e semaglutida. Comercialmente, a liraglutida é encontrada nos remédios Saxenda e Victoza, enquanto a semaglutida está presente em Wegovy, Ozempic e Poviztra. A decisão foi tomada durante a 25ª Reunião Extraordinária, realizada na quarta-feira (20/8)
Esta foi a primeira vez que a comissão analisou a possibilidade de oferta da semaglutida, a pedido da fabricante, a farmacêutica Novo Nordisk. A solicitação era específica para a formulação vendida como Wegovy, para uso em pacientes com obesidade grau II e III, sem diabetes, com 45 anos ou mais e doença cardiovascular estabelecida.
Já no relatório preliminar, publicado em maio, havia uma recomendação desfavorável ao produto. O principal argumento dos técnicos foi a elevada razão custo-efetividade incremental, forma utilizada para medir o custo-benefício de uma nova tecnologia principalmente em comparação com o tratamento já disponível no sistema de saúde. O impacto estimado em cinco anos foi entre R$ 6,5 bilhões e R$ 7 bilhões. Também foram considerados o alto impacto orçamentário e a incerteza quanto ao tempo de uso da medicação.
A farmacêutica baseou o pedido na premissa de que os pacientes utilizariam a semaglutida por apenas dois anos, seguindo a recomendação de uma agência internacional. Entretanto, esta forma de uso não está prevista na bula do medicamento, levando os membros da comissão a questionarem se o tratamento com semaglutida pode ser efetivamente limitado a um período específico, sem comprometer os benefícios clínicos a longo prazo.
O estudo-base para a avaliação mostrou que a semaglutida foi estatisticamente superior ao placebo na redução de eventos cardiovasculares adversos maiores em pacientes com 45 anos ou mais, com sobrepeso ou obesidade e doença cardiovascular estabelecida. No entanto, também houve uma maior taxa de descontinuação devido a eventos adversos, principalmente gastrointestinais, no grupo que utilizou o medicamento.
Liraglutida
Para a liraglutida, esta foi a segunda rejeição da Conitec em relação ao tratamento da obesidade. Em 2023, a tecnologia foi avaliada para pacientes com obesidade e IMC acima de 35 kg/m², pré-diabetes e alto risco cardiovascular, mas foi rejeitada por não ser considerada custo-efetiva e por apresentar elevado impacto orçamentário.
No relatório preliminar de maio deste ano, a comissão indicou que a liraglutida mantém a elevada razão de custo-efetividade incremental (RCEI) e expressivo impacto orçamentário estimado. Em cinco anos, projetou-se um gasto entre R$ 8,1 bilhões e R$ 22,6 bilhões, a depender da dose e do público abrangido.
Além disso, foram encontradas divergências metodológicas na análise do fármaco. Contou contra também o fato de que a empresa fabricante havia informado a impossibilidade de ofertar o medicamento ao SUS devido à intermitência na fabricação até setembro de 2025. O novo pedido de incorporação foi feito pela Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica.
Consultas públicas
Os dois processos receberam um grande número de contribuições em consultas públicas que ficaram abertas até junho. A maioria dos participantes, incluindo pacientes e profissionais de saúde, manifestou-se favoravelmente à incorporação, ressaltando a eficácia dos medicamentos na perda de peso e no controle de doenças associadas, como diabetes e problemas cardiovasculares.
Pacientes que utilizaram os medicamentos relataram perda de peso, controle glicêmico e melhora da qualidade de vida. O alto custo dos fármacos foi consistentemente apontado como a principal barreira para a continuidade do tratamento. Muitos relataram reganho de peso após a interrupção do uso devido à falta de condições financeiras. Profissionais de saúde destacaram a ausência de opções de tratamento farmacológico para obesidade no SUS, sendo a cirurgia bariátrica a principal intervenção disponível.
Atualmente, o SUS oferece tratamento para sobrepeso e obesidade com base nas diretrizes da Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas. Esta rede abrange a atenção básica, especializada ambulatorial e hospitalar, incluindo o procedimento cirúrgico para tratamento da obesidade, priorizando casos com comorbidades associadas ou maior risco à saúde. O Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) de Sobrepeso e Obesidade em Adultos vigente, entretanto, não prevê terapia medicamentosa