Tapa na Cara: conheça o esporte bizarro que viralizou nas redes e tem campeão mundial do Brasil

Foto: Marcelo Alonso

“Se alguém lhe der um tapa na cara, vire o outro lado para ele bater também”. A citação bíblica é colocada fielmente em prática no “Slap the face” ou “Tapa na Cara”, um esporte no mínimo inusitado que tem atraído cada vez mais fãs e adeptos ao redor do mundo

O que antes era visto apenas como um ato de violência ou insulto, agora tem ganhado status de esporte. Sim, há atletas que treinam e vivem apenas do ato de golpear a face do adversário.

Mas é preciso ter calma para analisar a nova modalidade: regras rígidas, atletas federados e muito respeito norteiam o esporte que busca vencer o preconceito para se consolidar como alternativa a atletas amadores ou profissionais sem espaço em outras categorias esportivas que usam a força.

Luta de Tapa na Cara entre Zuluzinho e Vasily Kamotsky — Foto: Reprodução

Criado na Rússia e com mais adeptos e competições no exterior, o Tapa na Cara busca espaço no Brasil por meio de Zuluzinho, brasileiro de 46 anos considerado o pioneiro no esporte e que foi campeão mundial em 2020

Filho do Rei Zulu, ícone do MMA no Brasil, Wagner da Conceição Martins, o Zuluzinho, seguia os passos do pai até receber o convite para participar de um evento até então desconhecido. Foi na Rússia que ele chocou o mundo ao rir depois de levar seguidos tapas do lutador mais temido do Tapa na Cara: Vasily Kamotsky, russo de 160kg e dono de uma mão pesada.

– Estava em um evento de MMA na Rússia e me convidaram. Fui e não sabia que ia encarar de início o campeão mundial, o cara que estava no auge, top dos tops do tapa na cara. Onde ele metia a mão, nocauteava os adversários. Ali é sorte, bateu, caiu ou vai pro saco, como a gente fala.

– No primeiro tapa achei que ia desistir, correr para casa, estava nervoso. Mas quando eu dei o primeiro tapa, comecei a sorrir e o pessoal do evento ficou espantado. Primeira vez e o cara está sorrindo com um tapa? Foram cinco tapas, quando fui dar o quinto tapa a minha tradutora falou que se eu desse o tapa errado, ia ser desclassificado, por isso que dei ele muito mais fraco, porque estava ganhando a competição. Na verdade, eles deram empate no evento, só que depois fui campeão. Me deram o título como um dos campeões mundiais por ter encarado o campeão atual – relembra e explica Zuluzinho.

A luta contra o maior nome do esporte não foi a única do brasileiro, que viajou pelo mundo para divulgar o evento que conheceu despretensiosamente. Agora, ele busca popularizar a modalidade no Brasil como uma espécie de embaixador: é o Zuluzinho do Tapa na Cara.

Mesmo internado em um hospital de São Luís, no Maranhão, onde se recupera de um procedimento, Zuluzinho conversou com o ge sobre o esporte e a experiência de ter lutado com o principal nome da modalidade logo em sua estreia 

O que é o Tapa na Cara

Uma luta de Tapa na Cara não tem tempo de duração determinado previamente. O embate consiste em cinco tapas na cara de cada lutador, que tenta nocautear o adversário em cada uma das tentativas. Ou seja, cada golpe é como se fosse um “round”. Depois de estapeado, o atleta tem até 30 segundos para se recuperar e seguir na luta.

Um lutador é considerado vencedor de uma luta de Tapa na Cara se nocautear o adversário ou vencer na soma de pontos ao fim dos cinco tapas. A avaliação dos golpes leva em consideração se o lutador executou o tapa dentro das regras (veja abaixo quais são) e quanto o adversário sofreu com os impactos, ficando ferido e/ou desorientado, por exemplo.

Luta de Tapa na Cara entre Zuluzinho e Vasily Kamotsky — Foto: Reprodução

O esporte tem organização e federações espalhadas ao redor do mundo, com maior força e tradição em Rússia, Estados Unidos e Polônia. Outro centro importante nos últimos anos está nos Emirados Árabes, com Dubai recebendo competições e movimentando financeiramente o segmento, que tem atraído ex-lutadores famosos e até personalidades da televisão para lutas de exibição.

– O Tapa na Cara na Rússia é conhecido como um esporte bizarro. É uma criação russa que chegou ao Brasil e está fazendo um sucesso imenso, se destacando muito, as portas estão abrindo para esse grande evento, que é uma novidade – explica Zuluzinho.

O “Power Slap”, que tem mais de seis milhões de seguidores nas redes sociais, é o maior torneio do mundo de Tapa na Cara. O evento, que vai para a sua 12ª edição, foi criado por Dana White, precursor do UFC e que tem investido no esporte paralelamente aos eventos de MMA.

No Brasil, apesar da criação de uma federação nacional, o esporte ainda não conta com um campeonato chancelado pela entidade e trabalha na organização de um “Brasileirão” da modalidade. Neste momento, competições amadoras e criadas por atletas de outras artes marciais são o celeiro de talentos, que acabam deixando o país em busca de reconhecimento e ganho financeiro.

As bolsas para a participação em torneios no Brasil, por exemplo, giram em torno de R$ 300 e R$ 3 mil para atletas consolidados no esporte. Lutadores em início de carreira ou amadores sequer recebem para ingressar nos poucos campeonatos existentes no país.

– Oficialmente ainda não teve campeonato brasileiro, estou com o projeto de fazer um agora. Como expandiu, tem muito brasileiro que já está competindo. Quero trazer os que estão competindo fora, tem muitos aqui. Começou a espalhar, os atletas começaram a participar dos eventos – conta Zuluzinho.

Regras básicas do Tapa na Cara

  1. Luta com 5 tapas para cada lutador;
  2. Não pode acertar o ouvido;
  3. Não pode acertar os olhos;
  4. Não pode acertar o queixo;
  5. O tapa tem que acertar a bochecha
Power Slap — Foto: Reprodução / Twitter Power Slap League

Além das regras citadas acima, algumas lutas levam características diferentes de acordo com o que foi combinado entre os lutadores ou a organização do evento. A forma como a mão é utilizada pode mudar, por exemplo: em algumas lutas o tapa só pode ser dado com a palma da mão, enquanto em outras apenas com a região dos dedos.

As lutas são supervisionadas por dois árbitros e têm um protocolo: os atletas ficam apoiados em uma mesa posicionada atrás do seu corpo, onde precisam apoiar as mãos para não se defenderem ou evitarem o impacto do tapa. O uso de protetores bucais e auriculares é liberado, além de talco para criar maior aderência nas mãos.

Como é o treino? E as categorias?

As categorias do Tapa na Cara são definidas pelo peso de cada atleta, com modelo parecido ao aplicado no boxe e em outras lutas. A altura de cada lutador não tem influência na sua classificação, nem mesmo o porte físico – é frequente ver lutas entre pessoas magras e obesas, por exemplo.

As mulheres também lutam e compõem cards no principal evento da modalidade atualmente.

É comum atletas amadores terem destaque mesmo sem nunca terem lutado anteriormente. A luta de braço é usada como parâmetro, com a técnica muitas vezes se sobrepondo à força. Por isso, cada vez mais o treinamento especializado tem se tornado fator fundamental.

Ainda sem uma “escola” de formação para lutadores, o Tapa na Cara é geralmente praticado por atletas de outros esportes ligados ao MMA. Os treinos são o grande problema atualmente para quem gostaria de ingressar no esporte, já que não existe um protocolo definido.

Os treinamentos raramente são feitos entre dois lutadores. O impacto dos golpes é evitado por quem pratica o esporte no dia a dia, já que pode causar desmaios e graves lesões na região da face.

– O treino está sendo naqueles bonecos de academia, de boxe, em saco de boxe. Alguns atletas estão imitando o Vasily Kamotsky, estourando melancia, fazendo aquelas coisas, aquele marketing para poder ser visto fora e ser chamado para os campeonatos – explica Zuluzinho.

Principal nome da modalidade, o russo Vasily Kamotsky mostra em suas redes sociais algumas técnicas de treinamento, com a musculação sendo o pilar principal. No entanto, ele costuma usar uma melancia para aprimorar o seu tapa

Enquanto ainda não há uma competição oficial e que nacionalmente aponte os principais nomes do esporte no país, o Brasil segue com torneios amadores e atletas ainda sem se dedicarem totalmente aos treinos e a um calendário esportivo da modalidade.

Alenilton

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