
Aos 49 anos de idade, Nina Marciano começou a sentir as primeiras ondas de calor, os chamados fogachos. Um dos efeitos mais comentados da menopausa veio acompanhado de irritabilidade e cansaço. “Parece que estou derretendo de dentro para fora”, detalha a hoteleira. Essa sensação súbita de calor intenso no corpo faz parte dos mais de 50 sintomas associados ao climatério – ciclo natural na vida da mulher que marca o fim da fase reprodutiva. Apesar de natural, a condição que acarreta diversos efeitos físicos e psicológicos ainda é tabu na sociedade.
Hoje, aos 52 anos, a hoteleira afirma que os sintomas estão mais amenos. Porém, até que esse momento chegasse, Nina enfrentou dificuldades que impactaram inclusive sua vida profissional. Os fogachos e episódios de esquecimento fizeram com que ela deixasse um emprego presencial para trabalhar remotamente. “Quando estava no escritório, ia ao banheiro e jogava água no rosto e no pescoço, ou trocava de lugar para ficar perto do ar-condicionado. Além disso, me esforçava em dobro porque, simplesmente, informações importantes sumiam da minha cabeça”, relembra.
O cotidiano de Nina é comum entre as mulheres brasileiras. É o que mostra o estudo Menopause Experience & Attitudes, conduzido pela farmacêutica Astellas em seis países: Austrália, Brasil, Canadá, Alemanha, México e Estados Unidos. Segundo o levantamento[1], as brasileiras estão entre as que mais sofrem os impactos da menopausa: 79% vivenciaram sentimentos psicológicos negativos, 58% sofreram com ansiedade, 26% com depressão, seguidos de constrangimento (20%) e vergonha (16%). Entre as participantes internacionais, 66% relataram sentimentos psicológicos negativos durante a menopausa. No total, participaram 13.800 pessoas, sendo 2.300 brasileiras.
O estudo também revela que a menopausa afeta a satisfação profissional das mulheres, comprometendo o engajamento e produtividade no ambiente de trabalho. A maioria das entrevistadas (80%) acredita não receber apoio suficiente para passar por esta fase dentro das empresas. Enquanto isso, 47% das mulheres relatam algum tipo de impacto negativo no trabalho, como queda na produtividade (26%), receio de contar aos colegas (17%) e até discriminação explícita (9%). Apenas 29% disseram se sentir confortáveis para conversar com o gerente imediato.
Ainda no campo relacionado ao trabalho, o Brasil é o país onde as pessoas mais relataram (49%) que a menopausa era uma barreira à progressão de carreira.
O impacto desse dado é significativo, visto que essa fase natural do ciclo reprodutivo da mulher tende a começar por volta dos 40 anos e se estender até os 55, podendo durar de sete a 14 anos. Ele engloba a perimenopausa, a menopausa e a pós-menopausa.
“As mulheres que entram na menopausa nos dias de hoje estão muito ativas, na maioria das vezes, no auge da carreira. E essa alteração de sintomas físicos e mentais aliado à falta de acolhimento vai impactar no trabalho delas”, pontua a ginecologista Thaís Ushikusa, diretora de Assuntos Médicos da Astellas no Brasil.
Estigmas e desconhecimento
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)[2], em 2014, o país tinha 29 milhões de mulheres vivendo na faixa etária do climatério, o que representa cerca de 7,9% da população feminina.
Apesar do número alto de mulheres vivenciando a menopausa e o climatério no Brasil e do aumento da visibilidade do tema, impulsionado por figuras públicas nas mídias sociais, o desconhecimento e os estigmas continuam sendo entraves para que mulheres busquem melhorar seus sintomas.
O tabu em torno do envelhecimento da mulher é na visão de Ushikusa uma das principais barreiras para que as mulheres acabem não recebendo os cuidados necessários durante este período da vida. “As pessoas tendem a minimizar o impacto dos efeitos da menopausa na vida como um todo. Isso impede que falem sobre o tema, busquem informações confiáveis e, consequentemente, ajuda profissional”, afirma a médica.
O relatório da Astellas confirma essa percepção: 65% dos brasileiros acreditam que a menopausa é um tema tabu, e que as pessoas se sentem desconfortáveis ao discuti-lo. Apenas 30% avaliam ter alto conhecimento sobre os sintomas; 17% têm pouco ou nenhum conhecimento. Para 66% dos participantes, os sintomas não são levados a sério.
O dado vai de encontro a avaliação de Nina. “Acho que todos os temas relacionados à mulher, de modo geral, são pouco debatidos. Mas a menopausa é pior ainda, parece que é o fim da linha, e não é. Estou aqui, aos 50 e poucos, produtiva, com dois filhos para criar, marido, boletos para pagar. Então não é um encerramento, é uma fase.”
Terapias e mudanças de hábitos
Atualmente, a terapia de reposição hormonal é uma das estratégias mais usuais para aliviar os efeitos da menopausa, como as ondas de calor. Entretanto, por diversos motivos, 43% das brasileiras com indicação não estão sendo tratadas atualmente no Brasil, mesmo dentre as que buscaram ajuda médica[3]. Por outro lado, os medicamentos não hormonais são uma inovação que tem chamado a atenção do mercado e da população feminina.
“As pessoas tendem a minimizar o impacto dos efeitos da menopausa na vida como um todo. Isso impede que falem sobre o tema, busquem informações confiáveis e, consequentemente, ajuda profissional”
Thaís Ushikusa, ginecologista e diretora de Assuntos Médicos da Astellas no Brasil
O médico Nilson Roberto de Melo, presidente da Associação Brasileira de Climatério (Sobrac), reforça a importância de novos medicamentos e tratamentos para a menopausa. “É fundamental buscar a melhora na qualidade de vida da mulher e ainda evitar doenças de longo prazo.”
O estudo MsBrain divulgado na Reunião Anual de 2023 da Menopause Society[4] na Filadélfia, Pensilvânia já mostrou uma correlação entre as ondas de calor durante o sono e um aumento de risco para o desenvolvimento da doença de Alzheimer. “A longo prazo vai aumentar o risco de doença cardiovascular, por hábitos de vida também inadequados e aumenta também o Alzheimer”, explica Melo.
Além dos medicamentos, hábitos saudáveis e alimentação equilibrada são aliados poderosos para passar pela menopausa com mais leveza. “Praticar atividades físicas e ajustar a dieta são altamente recomendados nesse período”, orienta Ushikusa. Ela ressalta também a importância de um tratamento personalizado. “Por exemplo, se uma paciente apresenta osteoporose associada à menopausa, deve-se considerar um medicamento específico para esse quadro.”
Diante disso tudo, produzir campanhas de comunicação, debater o tema a fim de aumentar a conscientização sobre a menopausa na sociedade, assim como aprimorar a capacitação dos profissionais de saúde são algumas das medidas que podem ser tomadas para melhorar a experiência das mulheres nessa etapa da vida, como pontua Ushikusa. “A primeira coisa que todos podem fazer é ampliar o diálogo e a oferta de informações confiáveis. Ainda é preciso investir em educação continuada para profissionais de saúde, pois nem todos estão habilitados a atender mulheres nessa fase.”