
Nos últimos anos, o Brasil tem apresentado uma tendência de queda nos índices de violência, surpreendendo muitos que já estavam descrentes em relação à segurança pública. De 2023 até hoje, os dados vêm indicando uma redução consistente nos homicídios, principalmente nas periferias urbanas, onde historicamente a violência faz parte do cotidiano.
Mas o que está por trás dessa mudança? Será que o país finalmente está encontrando caminhos mais eficazes para lidar com a criminalidade?
Um dos fatores que especialistas e ativistas apontam como relevante é a mudança de postura em relação à política de drogas — mais especificamente, os avanços em torno da descriminalização da maconha. Ainda que o debate esteja longe de um consenso e a regulamentação total não tenha sido implementada, o simples fato de o tema ter ganhado espaço e decisões judiciais começarem a tratar o porte de pequenas quantidades com mais racionalidade pode ter ajudado a frear a lógica punitivista que sempre atingiu, sobretudo, jovens negros das favelas e periferias.
A guerra às drogas, travada principalmente contra os pobres, encheu os presídios e os cemitérios, sem tocar na estrutura do tráfico. Durante décadas, o sistema penal brasileiro agiu seletivamente, prendendo e matando pequenos usuários ou “soldados do varejo”, enquanto os verdadeiros financiadores do crime permaneciam intocados. A descriminalização, ainda que parcial, rompe com esse ciclo de sangue e encarceramento em massa, devolvendo vidas e oportunidades a quem antes era só estatística.
Contra os números não há argumentos!
Números da violência no Brasil
2023
45.747 homicídios registrados, a menor cifra dos últimos 11 anos
Taxa de homicídios: 21,2 mortes por 100 mil habitantes, menor desde 2013
Armas de fogo: responsáveis por cerca de 32.749 homicídios (71,6%) — taxa de 15,2 por 100 mil hab
Violência racial: cerca de 35.213 vítimas negras em 2023; pessoas negras tinham 2,7x mais chance de morrer que pessoas não negras, aumento de 15,6% desde 2013
2024 (dados preliminares / Ministério da Justiça)
38.075 assassinatos, queda de 6 % em relação a 2023 (40.768)
Taxa: 17,9 homicídios por 100 mil habitantes — menor em mais de uma década
Evolução 2020–2024
De aproximadamente 45.522 mortes em 2020 para 38.075 em 2024: queda acumulada de 16 % desde 2020
Outro ponto crucial dessa virada na segurança pública foi a atuação mais firme do Judiciário. Nos últimos anos, vimos um endurecimento contra os abusos cometidos por policiais. Casos de execução, tortura e operações desastrosas que antes terminavam impunes agora estão sendo investigados, julgados e punidos. Não se trata de enfraquecer a polícia, mas de fortalecê-la com responsabilidade, respeito à lei e à vida.
Do outro lado da moeda, organizações criminosas também passaram a ser alvo de investigações mais estratégicas, com foco na inteligência e no combate às finanças ilícitas. O enfrentamento direto e mal planejado, que antes só aumentava o poder dos grupos armados, está sendo substituído por ações mais cirúrgicas, baseadas em dados, com articulação entre diferentes esferas do poder público.
Esses movimentos indicam que há sim uma mudança em curso. Não é exagero dizer que o Brasil está ensaiando uma nova forma de lidar com a violência — menos pautada na repressão cega e mais focada em justiça, inclusão e inteligência.
A violência está diminuindo, mas não acabou. E ainda há muitos desafios: garantir políticas públicas nas periferias, enfrentar o racismo estrutural, melhorar a educação, criar oportunidades e, acima de tudo, continuar lutando para que o Estado deixe de ser o maior violador de direitos nessas áreas.
A queda nos números pode ser o reflexo de uma sociedade que começa a entender que segurança não se constrói com balas perdidas, mas com dignidade encontrada.