A construção do voto de Flávio Dino no Marco Civil da Internet

Crédito: Rosinei Coutinho/STF

Quando Flávio Dino era ministro da Justiça o ataque a uma creche em Blumenau (SC) que vitimou crianças de 4 a 7 anos mexeu profundamente com ele. A tragédia no Sul do Brasil ocorreu dias depois de outro atentado em São Paulo em que uma professora morreu e outras três ficaram feridas. Os ataques em escolas acenderam um alerta vermelho para Dino, principalmente porque os planos foram arquitetados e inspirados por postagens em redes sociais.

Anos depois, já ocupando o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), as tragédias voltaram ao discurso de Dino. Dessa vez, na argumentação de que é preciso alterar o regime de responsabilidade das redes sociais durante o julgamento sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet.

O apelo aos danos que podem ser causados às crianças e adolescentes no ambiente virtual foi o argumento central do ministro para contrastar a visão mais liberal trazida pelo voto do ministro André Mendonça, que privilegiou a liberdade de expressão como um direito fundamental.

Com frases de impacto, Dino seguiu o roteiro esperado e votou por mudanças — adotou como regra geral de responsabilização para as plataformas o artigo 21 do Marco Civil, que exige apenas a notificação extrajudicial do ofendido. Contudo, manteve o artigo 19 de forma residual nos casos de crimes e ofensas contra a honra.

Durante seu voto, Dino disse que: “a ideia que a regulação mata a liberdade é absolutamente falsa” e argumentou que a “responsabilidade evita a barbárie e tirania”. E rebateu: “estamos dizendo não a delírios autoritários de que uma empresa privada vai se autorregular”. Repetiu o mantra do ministro Alexandre de Moraes que não existe “liberdade sem responsabilidade”.

Com a postura de Dino, a ala de ministros a favor de uma responsabilização mais rígida para as plataformas digitais ganhou força. Moraes embarcou no tema das crianças e lembrou do caso da estudante de 8 anos que morreu no Distrito Federal por conta do desafio com desodorante incentivado em redes sociais. “As redes não querem ser reguladas”, disse Moraes. Gilmar Mendes chamou a atenção de que as empresas estão preocupadas com o aumento dos custos em suas operações.

Nesse contexto, Mendonça pediu a palavra e reforçou que, em seu voto, ele fez a ressalva de proteção às crianças e adolescentes e que conteúdos perniciosos a esse público devem ser retirados.

Na sequência, Dino alargou os exemplos e citou teóricos como o filósofo grego Aristóteles e James Madison, um dos pais do federalismo norte-americano. Emendou com o exemplo de uma postagem dizendo para ocupar a Praça dos Três Poderes, no dia 8 de janeiro de 2023, que ainda está no ar. Depois citou fake news nos campos da política e economia. Trouxe, por exemplo, a notícia falsa sobre o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, que causou alta do dólar. Aqui, o ministro se alinha ao governo Lula, que vem pedindo alguma regulação nas redes sociais.

Dino reforçou: “Nunca vi uma companhia aérea começar a operar sem regulação em nome do direito de ir”. E lembrou que a responsabilização via artigo 21 do Marco Civil da Internet era a jurisprudência já aplicada no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Até agora, dos seis ministros que votaram, cinco votaram por algum tipo de responsabilização das redes sociais, o que deve prevalecer na Corte. Embora ainda não estejam fechadas as nuances dessa responsabilização

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