IA e as novas modalidades de trabalho e de contratação desafiam as leis

Colagem: Chris Moreira

Sem sinais de desaceleração, os avanços tecnológicos têm remodelado as relações de trabalho. O que parecia distante há menos de uma década se tornou praticamente regra: modelos dinâmicos como remoto, híbrido, horários flexíveis, contratos temporários, pejotização e “uberização” ganharam força. Esses formatos – sustentados, muitas vezes, por contratos civis e comerciais –, estão redesenhando as regras do mundo do trabalho. E, para embaralhar ainda mais essa dinâmica, termos como inteligência artificial e saúde mental ganharam espaço.

Hoje, já são mais de 15 milhões de pessoas trabalhando como microempreendedores individuais (MEIs) no Brasil, segundo o Ministério do Empreendedorismo, da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. Há ainda outros 1,5 milhão de trabalhadores por aplicativos – ocupação que passou a existir no país em 2014, com a chegada da Uber. Esse pode ser só o começo: um estudo do Fórum Econômico Mundial, em parceria com a Fundação Dom Cabral, revela que 23% das ocupações serão modificadas até 2027.

O mercado está em movimento, o que revoluciona as formas de trabalhar e desafia a legislação trabalhista. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que já completa mais de 80 anos em vigor, sofreu modificações ao longo dos anos – a última delas, com a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/ 2017) –, ainda é a principal norma aplicada pela Justiça do Trabalho.

Porém, as regras contidas na CLT abrangem, principalmente, os trabalhadores que têm a chamada carteira de trabalho assinada, com jornada de trabalho definida e subordinação. Contudo, o vínculo de emprego vem sendo substituído por outras formas de contratação, como seguro e contratos civis. No Brasil, em 2024, somente quatro em cada dez pessoas ocupadas possuíam o registro, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego.

A Justiça do Trabalho insiste em manter antigos paradigmas, ignorando as mudanças no mundo do trabalho, na perspectiva do professor titular da USP e sócio do Mannrich Vasconcelos, Nelson Mannrich. “Trabalhadores de plataformas digitais, por exemplo, necessitam de proteção adequada, mas isso não implica enquadrá-los na CLT. O foco deve ser garantir direitos fundamentais, como dignidade, saúde e condições mínimas civilizatórias”, diz.

Na opinião dele, a Justiça do Trabalho precisa reconhecer diferentes formas de vínculo e aplicar a legislação adequada para cada situação, “respeitando a autonomia das partes e o contrato firmado”. Muitas decisões, afirma o professor, “ignoram a autonomia dos trabalhadores em negociações, o que precisa ser corrigido”.

Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal (STF) tomou decisões reconhecendo novas modalidades de trabalho. “O STF tem sinalizado uma valorização da livre iniciativa, admitindo outras modalidades de contratação além das previstas na CLT. Essas mudanças estão revolucionando o ambiente de trabalho, indicando a necessidade de uma legislação mais abrangente e mudanças profundas na sociedade”, avalia o professor.

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