Primeiros vestígios são encontrados no cemitério de escravizados em Salvador

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Os primeiros vestígios de pessoas enterradas no cemitério de escravizados localizado no estacionamento da Pupileira, espaço de eventos no bairro de Nazaré, em Salvador, foram encontrados na sexta-feira (16). Os pequenos fragmentos são do século 19 e podem ajudar a localizar as pessoas enterradas no local.

Conforme a arqueóloga e coordenadora do projeto que investiga a área, Jeanne Dias, a equipe precisou enfrentar as chuvas, que deixaram o solo encharcado, para chegar às camadas arqueológicas do solo.

“Nosso objetivo é localizar vestígios remanescentes ósseos dos antigos escravizados e de outras pessoas que foram enterradas nessa antiga área da cidade, no antigo cemitério do Campo da Pólvora”, explica.

As escavações no cemitério começaram na última quarta-feira (14), data que marcou os 190 anos da Revolta dos Malês, que aconteceu em Salvador, em 1835. O marco histórico é caracterizado como o maior levante de escravizados da Bahia e está diretamente ligada a descoberta do sítio arqueológico.

A localização do cemitério foi descoberta durante a pesquisa de doutorado da arquiteta e urbanista Silvana Olivieri, formada pela Universidade Federal da Bahia (Ufba). Na análise da pesquisadora, há a possibilidade de que os mártires da revolta dos Malês estejam no cemitério, assim como pessoas que participaram da Revolta dos Búzios e da Revolução Pernambucana, ocorridas em 1798 e 1817, respectivamente.

Ainda segundo os registros levantados pela pesquisadora, indígenas, integrantes da comunidade cigana e pessoas que não tinham como custear o enterro também tiveram os corpos descartados no local. O número total de corpos na área ainda é desconhecido.

Pesquisa

Possível localização de cemitério de escravizados do século 18 é investigada em Salvador — Foto: Silvana Olivieri

🔎 A pesquisadora arquiteta e urbanista Silvana Olivieri utilizou como fonte diversos mapas e plantas de Salvador, do século 18, para chegar até a localização do cemitério. Ela também leu artigos dos historiadores Braz do Amaral (1917) e Consuelo Pondé de Sena (1981), e um livro escrito em 1862 por Antônio Joaquim Damázio, contador da Santa Casa.

O cemitério foi inicialmente administrado pela Câmara Municipal e, em seguida, passou a ser de responsabilidade da Santa Casa. Registros históricos apontam 150 anos de atividade até 1844, quando a instituição comprou e começou a operar o Cemitério Campo Santo, localizado no bairro da Federação.

“Os sepultamentos eram realizados em valas comuns e superficiais, geralmente em condições bastante precárias e indignas, sem nenhuma cerimônia religiosa ou rito fúnebre, nem há registro de capela”, apontou SIlvana.

A descoberta foi apresentada para a Santa Casa em setembro de 2024, durante reunião com a presença do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), mas não houve retorno. Em dezembro, a pesquisadora e o advogado e professor de Direto da Ufba, Samuel Vida, recorreram ao Ministério Público da Bahia (MP-BA), que intermediou a conciliação. Em março deste ano, a escavação foi liberada.

“O cemitério sofreu um apagamento histórico, desaparecendo tanto da paisagem visível como da memória da cidade”, disse a pesquisadora.

Possível localização de cemitério de escravizados do século 18 é investigada em Salvador — Foto: Silvana Olivieri

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