Mendonça vota contra quebra de sigilo de forma genérica em investigações criminais

Crédito: Gustavo Moreno/STF

Está empatado em 2 a 2 o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) que discute os limites da quebra de sigilo de buscas na internet de forma genérica e não individualizada em investigações criminais pela Justiça. O empate ocorreu com o voto do ministro André Mendonça na tarde desta quarta-feira (23/4) antes de a sessão ser interrompida por causa da visita do presidente do Chile Gabriel Boric ao Tribunal. O julgamento será retomado na quinta-feira (24/4).

O recurso foi proposto no STF pela empresa Google contra decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que manteve a quebra de sigilo de um grupo indeterminado de pessoas que fizeram pesquisas relacionadas à vereadora Marielle Franco e a sua agenda nos quatro dias anteriores ao atentado em que ela e o motorista Anderson Gomes foram assassinados, em 14 de março de 2018.

A relatora, ministra Rosa Weber, votou antes de se aposentar e, portanto, seu voto continua válido. Weber dá provimento ao recurso da Google. Para ela, o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) não admite o fornecimento de dados genéricos. Dessa forma, uma ordem judicial genérica e não individualizada para informar os registros de conexão e de acesso de todos os usuários que fizeram determinado tipo de pesquisa desrespeita os direitos fundamentais à privacidade, à proteção de dados pessoais e o devido processo legal.

Nesta quarta-feira, Mendonça acompanhou a ministra Rosa Weber. Assim, para o magistrado, não é possível a quebra do sigilo telemático indeterminado de forma aleatória.

Mendonça pediu vista do processo em outubro de 2024 e, na época, mostrou-se preocupado com as possibilidades abertas ao se permitir acesso indiscriminado às buscas de internet de um grupo indeterminado. O ministro apontou, por exemplo, o provável aumento da pesca predatória de provas ou “fishing expedition”, prática proibida pelo ordenamento jurídico brasileiro.

O ministro sugeriu delimitar o universo de pessoas para ocorrer a quebra do sigilo telemático. “Compreendo que o risco de autorizar medidas investigatórias sobre sujeitos indeterminados, ainda que determináveis, mas sobre os quais não recaia nenhum elemento de suspeita previamente identificado, é demasiadamente elevado, não se adequando às exigências constitucionais aplicáveis ao caso”, afirmou. “Estamos abrindo uma porta que não sabemos onde vai dar”, acrescentou.

A posição de Mendonça é diferente da do ministro Alexandre de Moraes e de Cristiano Zanin. Para eles, é possível que uma decisão judicial dê acesso a buscas feitas na internet por um grupo genérico de pessoas. No entanto, ambos ponderam que a quebra do sigilo telemático deve ser fundamentada, estar em conformidade com o Marco Civil da Internet e que o grupo de pessoas “indeterminadas” possa ser determinado a partir de provas prévias que justifiquem a medida.

Durante os debates da sessão desta quarta, Mendonça citou memorial da Google dizendo que juízes estão autorizando a quebra indeterminada de buscas em casos de roubos e furtos. A quebra é para ver quem pesquisou sobre itens roubados.

Na sequência, Moraes pediu a palavra e disse que o tribunal precisa tomar cuidado para não decidir por conta da patologia. Reforçou que a impossibilidade da quebra do sigilo telemático pode atrapalhar importantes investigações, como em caso de pedofilia e ponografia infantil. O ministro Flávio Dino, que não pode votar, disse achar estranho que a Google entre com um recurso para impedir que o Estado faça o que a empresa já faz, que é quebrar o sigilo de um grupo de pessoas indeterminadas com intuito comercial. “É uma observação de ordem ética”, afirmou.

A discussão ocorre no RE 1301250 e tem repercussão geral conhecida, portanto, o que for decidido servirá de parâmetro para os demais tribunais do país.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

3 + quinze =