
O uso de substâncias alucinógenas na confecção de alimentos como doces e bolos pode mascarar um grande perigo à saúde de quem os consome. Esses produtos podem abrir portas para doenças mentais e até levar à morte, segundo especialistas.
O consumo dessas substâncias em forma de alimento costuma prolongar mais os seus efeitos porque a absorção via gastroentestinal é feita de forma mais lenta, prolongando também os riscos.
Nesta semana, a Prefeitura de São Tomé das Letras divulgou um alerta aos turistas por conta de alguns doces vendidos nas ruas da cidade chamados de “brisadeiros”, “brisamelos”, “brownies mágicos”, “brigaconha” ou “doces mágicos”.
De acordo com a administração municipal, nos dois primeiros meses deste ano, 13 pessoas se queixaram de sintomas como alucinações, diarreias, vômitos, xerostomia (boca seca), palpitações e desconforto no tórax, após consumir os alimentos que poderiam conter substâncias lícitas, como maconha, além de medicamentos psicotrópicos e cogumelos alucinógenos.
Alucinações, delírios, esquizofrenia e morte
Essas substâncias são classificadas como perturbadoras do sistema nervoso central e podem causar alteração da percepção, como alucinações e delírio, explica o médico psiquiatra Frederico Garcia, professor do departamento de psiquiatria da UFMG e coordenador do Núcleo de Pesquisa em Vulnerabilidade de Saúde.
“O que essas substâncias fazem é alterar a forma como o nosso aparelho sensorial, na parte que analisa as informações do nosso cérebro, integram isso e, de alguma forma, a gente perde também a capacidade de julgar o que é real e o que não é real.”
O uso de substâncias psicotrópicas pode ser o gatilho para a esquizofrenia, em pessoas que têm uma tendência a desenvolver a doença.
“Quando a gente desencadeia o episódio psicótico induzido pelas drogas, pode ser o primeiro episódio que vai desencadear a esquizofrenia que, se a pessoa não tivesse usado a droga, teria ficado latente para o resto da vida dela. Hoje na população há 1% de pessoas que desenvolvem esquizofrenia. A quantidade de pessoas que tem o potencial de desenvolver é muito maior, mas como elas não têm o primeiro episódio psicótico, elas não vão ter a doença. O que a droga acaba fazendo é com que elas tenham o primeiro episódio psicótico e aí começa a doença, que é tratável, mas é para a vida inteira”, alerta Garcia.

Outro efeito grave das substâncias sintéticas existentes nos doces alucinógenos, como o LSD e o ecstasy, é que, se usados em doses excessivas, podem causar a síndrome serotoninérgica, uma alteração que pode levar à morte.
“Essa síndrome, normalmente começa com alteração, alucinação, desorientação, desorganização, segue com um aumento da temperatura bastante importante e se a temperatura não for controlada, a pessoa pode começar a convulsionar e, se não for tratada a tempo, pode inclusive evoluir a óbito”, afirma o médico.
Além de afetar o cérebro, esses doces podem causar distúrbios também no corpo devido à forma como são preparados.
“Como são usadas substâncias sintéticas ou cogumelos que são produzidos de forma muito rupestre ou que não existe muito controle, muitas vezes essas substâncias vêm agregadas a uma série de contaminantes que, além deles poderem ser tóxicos e cancerígenos, podem também produzir efeitos colaterais como diarreia, náusea e mal-estar”, explica Garcia.
Há ainda o risco do vício, o que pode ocorrer com a maconha e o ecstasy.
A orientação para quem sentir desconforto, crise de ansiedade, aumento de temperatura, agitação ou confusão após consumir produtos que contenham substâncias alucinógenas é buscar atendimento médico o mais rapidamente possível.
O psiquiatra alerta que não há dose segura para o uso dessas substâncias, já que seus efeitos mudam de pessoa para pessoa.
“Os efeitos colaterais dependem da pessoa. Tem gente que é muito resistente, tem gente que é pouco resistente, vai depender da quantidade de receptores que ela tem no cérebro. Mas a questão é que a pessoa está consumindo uma coisa que ela não tem noção da origem e da formulação e está colocando dentro do corpo dela algo que não tem o menor conhecimento do que se trata de fato. Não é um produto que você compra na farmácia, que tem um controle de qualidade. A pessoa que está produzindo o doce ou que está produzindo a substância, às vezes erra a mão, e esse erro pode ser fatal para algumas pessoas”, diz Garcia.