“A gente não tem toalha no treino, sabe? Eles não fornecem toalha pra gente tomar banho depois do treino. A gente não pode deixar a chuteira no clube. A gente perdeu o direito de fazer muita coisa ali. Não tem liberdade nenhuma, nenhuma mesmo.”
O desabafo foi feito por uma das jogadoras do time de futebol feminino do Atlético-MG.
– Você tem que ver que é surreal. A gente indo para jogo com tênis velho. É surreal – disse uma das atletas.
Boa parte do elenco feminino do Galo tem vínculo até o dia 31 de dezembro. Algumas jogadoras assinaram pré-contrato com outros clubes. Outras ainda aguardam contato da diretoria alvinegra para possíveis renovações.
O ano do Atlético-MG feminino foi cheio de oscilações. A equipe começou a temporada sendo eliminada pelo Corinthians na Supercopa, fez campanha ruim no Brasileirão, brigando contra o rebaixamento, e terminou 2023 com o vice do Campeonato Mineiro, perdendo para o Cruzeiro.
Recentemente, a diretoria alvinegra demitiu a técnica Vantressa Ferreira e ainda não anunciou um novo nome. Fontes consultadas pela reportagem afirmaram que Robertinha, auxiliar fixa do time, deve ser a nova comandante da equipe.
Atualmente, as Vingadoras aprimoram a parte física na Arena Santa Cruz, campo público, que pertence à Prefeitura de Belo Horizonte e é concedido para parceiros da comunidade da região Nordeste.
Às vésperas de partidas importantes, como a final do Campeonato Mineiro deste ano, as jogadoras trabalharam na Cidade do Galo, principal centro de treinamento do Atlético. O CT tem oito campos disponíveis para o profissional e as categorias de base do masculino. O local conta com hotel e tem projetos de ampliação.
O gramado da Arena Santa Cruz é sintético, com estrutura de futebol society. O local atende aos jogos de futebol amador na capital mineira. As jogadoras reclamam das condições do próprio campo e da estrutura no entorno.
– (O piso do campo) é duro, né? Você suja o seu uniforme, você rasga o seu uniforme, as chuteiras… (o campo) acaba com a sua chuteira. Você fica com o corpo todo dolorido. Eu fico uma semana com dor. Saio de lá toda dolorida – disse uma jogadora.
As atletas relatam que treinar em um campo fora dos padrões para profissionais atrapalha a preparação para competições. Em Belo Horizonte, o time costuma mandar os jogos no Sesc Venda Nova, campo com grama natural.
– A gente sente, porque treina em society. Aí dá canelite. Você fica com dor nas costas, fica com perna pesada. Dá cãibra, entendeu? E outra, não é por falta de campo, porque campo é o que mais tem em BH.
Além da questão do campo, que não é o ideal para as jogadoras, a estrutura do complexo também rende reclamações. Segundo as jogadoras, elas evitam utilizar os vestiários do local. O campo é público, com as “peladas” de fim de semana e campeonatos amadores acontecendo no espaço.
– Às vezes (usamos o vestiário) só pra trocar de roupa, porque o vaso é muito sujo.
Vila Olímpica
A Vila Olímpica, local onde os profissionais do Atlético treinavam até o fim dos anos 90, é utilizada pelo futebol feminino para a fisioterapia e academia. Durante os dias de treino, o time faz atividades na Arena Santa Cruz.
Depois do treinamento, as jogadoras vão para a Vila Olímpica, que atualmente funciona como clube recreativo do Atlético. Lá realizam a segunda parte da preparação e também fazem as refeições no local. Cerca de 10km de distância separam as duas estruturas utilizadas pela categoria.
As atletas relatam que as atividades na Arena Santa Cruz e na Vila Olímpica as afastaram da instituição. Além de estarem limitadas dentro do Atlético, as atletas utilizam o mesmo espaço que sócios do clube recreativo, que é aberto ao público.
“Da Vila (Olímpica) o espaço que usamos é a fisioterapia, que foi montada lá, e a academia. Mas nós sentimos como se não fizéssemos parte do clube, porque não temos liberdade nem na Vila Olímpica.”- comentou uma jogadora.
Material esportivo
Outro ponto relatado pelas atletas é a indisponibilidade de materiais esportivos. Durante 2023, as jogadoras receberam dois kits de uniformes para a disputa de três campeonatos (Supercopa, Brasileirão e Mineiro). As trocas eram quase impossíveis, mesmo quando os materiais já não tinham mais condições de uso.
– Eles deram dois (kits) para o ano todo. Aqueles uniformes de pano mais grosso, sabe? Fora que algumas atletas ganharam uniforme já encardido e com cheiro impregnado – relatou uma das jogadoras.
Era uma dificuldade para você conseguir trocar de tênis, por exemplo. A comissão toda trocou o tênis. Isso foi surreal. Trocaram o tênis da base, e as meninas do profissional não trocaram, não fizeram questão – desabafou outra atleta.
“A gente indo com as mesmas roupas pro jogo, roupa que já tava velha. Foi um descaso total.”
Em entrevista coletiva, na segunda-feira passada, o presidente da associação do Atlético, Sérgio Coelho, afirmou que o feminino ainda não tem orçamento fechado para a próxima temporada. Segundo ele, a partir de 2024, a categoria vai passar a ter gestão separada do masculino.
– Nós estamos fechando o orçamento, não tenho esse valor e devido também às minhas ocupações. Eu conversei isso com os 4Rs, com o Rubens, especificamente, que o futebol feminino, nós vamos ter uma gestão separada, porque eu já estou assumindo uma cadeira no Conselho de Administração, presidente do comitê de futebol, presidente da associação, e tem minhas coisas. Não está definido isso, mas é possível que caminhe por isso aí, vai ter alguém que vai falar pelo futebol feminino, mas é uma preocupação nossa de ter o futebol feminino bem organizadinho.