Por Alenilton Malta | De cara com as feras
Terça-feira 25/04/2023
Durante quase 20 anos, Carlos Terra, falecido em 2019, pressionou a Justiça brasileira e órgãos internacionais para que acusados pela morte do filho fossem julgados.
“Meu filho foi queimado vivo”. Era com cartazes como esse que Carlos Terra, pai de Lucas Terra, protestava pela cidade de Salvador. O adolescente de 14 anos foi queimado vivo em março de 2001 e três pastores foram acusados pelo crime. Durante os 22 anos que o caso tramitou na Justiça baiana, apenas o pastor Silvio Galiza foi preso.
Os três agravantes para o homicídio são: o motivo torpe, o emprego do meio cruel e a impossibilidade de defesa da vítima. A defesa dos pastores disse, em nota, estar convicta da inocência deles, e que não há provas ou indícios contra os dois pastores, Joel Miranda e Fernando Aparecido.
A acusação ainda aponta que Lucas teria sido vítima de estupro. O Ministério Público da Bahia (MP-BA) não informou se eles também irão a júri pelo abuso sexual.
Durante os anos de espera pelo júri popular, o pai do menino lutou incondicionalmente pela condenação dos envolvidos. Ele acampou em frente ao fórum em Salvador, publicou um livro sobre o homicídio e rodou o mundo pressionando autoridades nacionais e internacionais.
Depois de anos de luta, Carlos Terra não verá o resultado do julgamento dos dois pastores: ele morreu em 2019, após sofrer uma parada respiratória decorrente de uma cirrose hepática. Relembre a trajetória do pai de Lucas Terra após a morte do adolescente:
Livro
“Lucas Terra – Traído pela Obediência” foi publicado de forma independente e tem mais de 100 capítulos onde o assassinato da vítima é detalhado. Na obra, Carlos Terra resgata memórias do filho, que cresceu em uma família cristã e sempre foi muito dedicado à igreja.
“Este livro relata a história verdadeira de um pai que percorreu em quilômetros o equivalente à três voltas no planeta terra em busca de justiça por seu filho adolescente de 14 anos, que foi Traído Pela Obediência, amarrado, amordaçado, espancado, violentado e queimado vivo por pedófilos assassinos no Brasil”, escreveu no epílogo do livro.
Carlos relata que a morte do filho aconteceu pouco tempo depois que a família se mudou do Rio de Janeiro para Salvador, onde deveria ficar por apenas três meses. Depois desse período, pai e filho viajariam para a Itália, onde a mãe do menino estava morando na época.
A viagem à Itália não aconteceu, porque semanas antes Lucas foi estuprado e queimado vivo pelos pastores Joel Miranda, Fernando Aparecido da Silva, réus pelo crime, e Silvio Galiza, que já foi julgado e condenado a 18 anos de prisão. Momentos antes do assassinato, o pai relatou que Lucas o telefonou e avisou que estava na igreja com o pastor Silvio.
“Eu pensava que o lugar mais seguro que o meu filho poderia estar era no templo”, retratou Carlos Terra em um dos capítulos do livro.
Volta ao mundo
Em um blog criado em 2011, amigos da família de Lucas Terra transcreveram uma relação de todos os órgãos, nacionais e internacionais, onde Carlos buscou ajuda. A lista reúne a Organização das Nações Unidas (ONU) em Genebra, e o Ministério da Justiça, em Brasília. Os relatos vão de 2001 até 2011, quando o crime completou 10 anos.
- “No dia 15/01/2002, estive em Roma na Itália denunciando o crime em ONG’s Internacionais de Direitos Humanos.
- No dia 18/02/2002, estive em Genebra, na Suíça, pedindo ajuda aos órgãos Internacionais de Direitos Humanos na ONU (Organização das Nações Unidas).
- No dia 04/07/2002, estive em Brasília no Ministério da Justiça, onde falei pessoalmente com o Ministro, pedindo a prisão do pedófilo assassino de meu filho, mas ele não foi preso”.
Ao final do relação dos locais visitados ao longo dos 10 anos posteriores ao crime, ele afirmou que o seu maior desejo era ver os acusados presos pelo crime.
“Irei lutar até o fim da minha vida para ver estes pedófilos assassinos presos. Eles não podem continuar impunes, andando, livremente pelas ruas e shoppings de nosso país, para destruir outras famílias, como destruíram a minha”, afirmou
Acampamento no fórum
Em 2012, Carlos Terra acampou na frente do Fórum Ruy Barbosa, em Salvador, como ato de prtesto para cobrar celeridade da Justiça. Na ocasião, Galiza já havia sido julgado e condenado a 18 anos de prisão e cumpria o regime semiaberto.
Galiza também já havia acusado Joel Miranda e Fernando Aparecido de participação no assassinato, mas os dois ainda não haviam sido julgados, o que indignava o pai de Lucas Terra.
Em 2012, o crime completava 11 anos e Carlos temia que ele prescrevesse. Na ocasião, o g1 procurou o Tribunal de Justiça, que disse em nota que se sensibilizava com a dor do pai da vítima e que todos os trâmites do caso estavam ocorrendo dentro da normalidade.